Arquivo: Pregão de 1895
 
 
   
     
      |  | [Impresso].-Guimarães:[CFN],1895 (imp.Typ. de Silva Caldas).-[1]f.;44x25 cm.Dois exemplares impressos s/ papel branco.-Restaurado com fita cola. Segundo Domingos Ribeiro Dias da Silva, de 1865 a 1884 as Festas Nicolinas tiveram grande brilho. De 1884-1895 não houve pregão. Cf.nota 6,p.174. Em 1895 ressurgiram as Festas Nicolinas, embora sem o brilho de outrostempos. Vd. Os festejos de S. Nicolau. “Comércio de Guimarães”.(9 Dez. 1895)2.Impresso s/ papel Branco com capa de cor verde .- Existem três exemplares, um com dedicatória da Comissão, outro com etiqueta “Legado à Sociedade Martins Sarmento por Thomaz Julio da Costa Sequeira, general reformado” e outro “Off. à Sociedade Martins Sarmento em 12-VII-1922, por J. L. de F.”(João Lopes de Faria). 
 Recitado por Jeronymo Ribeiro da Costa Sampaio
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Em 1882, os festejos dos estudantes a S. Nicolau foram modestos, tendo sido promovidos pelos estudantes de instrução secundária do Instituto Escolar da Sociedade Martins Sarmento. A chuva também não ajudou. Houve bando, que foi lido por João Maria Peixoto de Carvalho do Amaral e Freitas. Não conhecemos nem o texto, nem o seu autor.
 
 
 
Em 1883, os organizadores das festas voltaram a ser os jovens estudantes da SMS. Houve bando, tendo-se repetido a declamação do de 1852, do Cónego Oliveira Cardoso, e... pouco mais. O pregoeiro foi Joaquim Justiniano de Araújo Leão Martins.
 
 
 
No ano seguinte, as festas continuavam agónicas. Houve bando no dia 5, desconhecendo-se texto, autor e pregoeiro.
 
 
 
Depois, seguir-se-iam 10 anos sem as festas dos estudantes a S. Nicolau. Regressam em força em 1895. E voltou o pegão, o primeiro escrito pelo poeta Bráulio Caldas. A celebração do dia 5 de Dezembro foi assim descrita pelo jornal Religião e Pátria:
 
Depois, o bando, muito bem posto, troando à sua frente dezenas de tambores. É de Bráulio Caldas a poesia, fina de graça, e de dicção, rica de imagens e de galanteria. Recitava-o o académico Jerónimo Sampaio, e força é dizer que os graciosos versos de Bráulio Caldas não poderiam encontrar melhor intérprete. 
 
 
 
O pregão de 1895 é inovador, afastando-se das fórmulas que até aqui eram usuais, passando a cumprir uma função de crítica satírica aos tempos que se viviam.
 
 
 
BANDO ESCOLÁSTICO DA FESTA ACADÉMICA 
 
O S. NICOLAU EM GUIMARÃES
 
RECITADO EM 5 DE DEZEMBRO DE 1895
 
Por
 
Jerónimo Ribeiro da Costa Sampaio
 
 
 
D. VIRGÍLIO MARONIS, FRANCISCO BANDARRA DE PÂNDEGA E BREZUNDELLA, por sua majestade d. Xinfrim Banzé, juiz perpétuo da confraria de S. Nicolau de Guimarães, GOVERNADOR in partibus da briosa mocidade académica; POETA dos três costados; ESCRITOR honorário de várias associações científicas e literárias; TESOUREIRO substituto da Associação de Socorros-Mútuos Rabelais, Simão Simões & C.ª; CAMAREIRO-MOR da Sociedade do belo sexo; MOÇO FIDALGO do paço das Penúrias; PRESIDENTE EFECTIVO da sociedade do Sem Vintém; ENGENHEIRO director da grande e importante fábrica da Cabala & &
 
Mando a todos os súbditos académicos presentes e futuros, antigos e modernos
 
 
 
Que se faça cumprir; mas sob o meu comando
 
As prescrições da lei deste solene bando.
 
 
 
Prevenção: vou falar e todos tenham brio
 
De ouvir com a atenção, sem mais ninguém dar pio.
 
 
 
Eu faço aqui lembrar o antigo chafariz…
 
Quem estudante não é não mete aqui nariz.
 
Se o contrário fizer damos-lhe na pavana
 
Como galhardo fez ao negro Gungunhana.
 
 
 
Ó grande Nicolau da Lícia filho amante.
 
Das virgens protector, amigo do estudante.
 
- Tu és maior no céu que o grande taumaturgo,
 
Na terra muito mais, (aqui no nosso burgo).
 
Por isso ó muito amado, em nós tens um sacrário,
 
Havemos de fazer-te, em breve, um centenário.
 
 
 
Salvé ó Guimarães; herói de antigas eras!
 
É teu este festim das nossas primaveras.
 
 
 
D. VIRGÍLIO descera as entranhas da tumba
 
Ressuscitando a festa a toques de zabumba.
 
 
 
Há dez anos que estará a pobre, sem alento!...
 
Arquivada, entre o pé das fólios da sarmento!
 
 
 
Fez vigorar as leis, costumes, palavrórios
 
Do antigo Estatuto e de antros papelórios.
 
 
 
Mas para que nunca mais se esqueça o festival
 
Ordena D. Virgílio a luta eleitoral.
 
 
 
E renhida e sangrenta!... em votos guerreados
 
Como a eleição geral dos nossos deputados.
 
 
 
Eu mando reformar o Código Civil,
 
Aos artigos da posse hei-de acrescentar mil.
 
                               *
 
Em posse ficará, depois de lauta ceia
 
Dançarem uma valsa ao club e à assembleia.
 
O místico estudante, o triste visionário
 
Há-de cantar à noite a fado do Hilário
 
Enquanto alegres nós, dançamos, sem vintém
 
Uma valsa de Strauss e outra de Chopin,
 
Será posse cumprir com alma e coração
 
A nova lei que manda a lei da instrução.
 
A grande lei de quatro e de noventa e cinco,
 
- D. Virgílio é quem manda e manda com afinco.
 
Pois quando ele ditara a magna lei de bronze
 
Pensava em quatro ou cinco em entre dez e onze...
 
Em posse ficará fazer uma postura
 
Para iluminar a azeite a triste rua Escura.
 
 
 
Musas de Anacreonte - abri-nos os salões
 
E reserva o Champanhe em doces libações...
 
Confeitos e missanga e o fino puro e terno
 
Que, Horácio tanto amou nas vinhas de Phalerno.
 
Para que nós sem perder o tino à galhofeira
 
Possamos dar mais brilho à nossa brincadeira.
 
 
 
Hoje, o Compêndio audaz, que nos atroa e massa,
 
Recolhe-se a quartéis, connosco não faz praça.
 
 
 
A Gramática, esbelta e cheia de quindins,
 
Faz oração mental... não entra nos festins.
 
 
 
O Cornélio e o Fedro e outros figurões
 
Dormem a sono solto ao lado de Camões.
 
 
 
As ciências naturais e o X da Matemática
 
Deixam ficar em zero a sua dogmática.
 
 
 
A Literatura, a História e a Filosofia
 
Foram comer marisco ali ao Zé Maria.
 
 
 
E o Velho, - o Latim, de barbo amarelada,
 
De óculos a meio pau, fungando uma pitada,
 
Remorde-se de inveja e cheira e faz pirraças
 
Ao discípulo que toca e dança e diz chalaças.
 
 
 
Tricanas, colibris das fábricas de linho
 
Vinde ouvir, sem temer, a voz do meu carinho.
 
Se já perdeu de moda a música e o canto
 
Das notas magistrais do tal carvalho santo.
 
Vinde ver, adorar, num largo prazenteiro
 
Como está levantado o nosso bom pinheiro.
 
Um pinheiro elegante, esbelto e de arrebiques
 
Tal como a pedestal de D. Afonso Henriques.
 
O pinheiro maior, o mastro mais gigante
 
Que ao longe e ao largo canta a festa do estudante.
 
                               *
 
Vós, senhoras gentis, de pura e fina raça.
 
Fidalgas de solar, cheios de mimo e graça.
 
Vós todas, ó gentis da terra, que adoramos,
 
Escutai, recebei o brinde que vos damos.
 
Reparai como canta amor e amizade.
 
O grupo juvenil da nossa mocidade.
 
É posse, é obrigação dar-vos as maçãzinhas.
 
Esses pomos de amor, perfeitos, coradinhas.
 
Essa prenda que vai na lança de Cupido
 
Ferir o coração mais duro o ressequido.
 
Mas, em troca, gentis, volvei um terno olhar
 
Para estes Romeus que vivem do luar...
 
Nóss vivemos na Lua a cantar madrigais
 
E andamos por aqui, gastando o cobre aos pais,
 
Mas… perdão… nossos pais já foram como nós
 
E a História não mentiu; já fala dos avós!
 
Rostos de branco e creme - ó magnólias puras
 
Que perfumais nossa alma! ó anjos, ó venturas.
 
No meigo azul o sol rebrilha para amar-vos,
 
E nós, como rivais, sonhamos para dar-vos
 
Um palácio primor, feito de crisântemos!
 
Embalado na brisa, onde vos adoremos.
 
Iguarias de amor em esplêndidas faianças
 
De rosas e lilás, de sonhos e de esperanças!...
 
 
 
Agora, um terno adeus, chora ao longe a saudade,
 
Ao descer ao Poente o sol da mocidade!
 
 
 
Companheiros – partir… que rufem os tambores,
 
Saudemos Guimarães, este jardim de flores.
 
 
 
 
  Transcrição e comentários de António Amaro das Neves 
  
 
  Publicado originalmente em http://araduca.blogspot.pt/ 
  
 
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