Arquivo: Apontamentos para a história das Danças Nicolinas


Blogue de
António Amaro das Neves

As danças são um dos números incontornáveis das Festas Nicolinas. Não falta, aliás, quem as associe à origem das festas dos estudantes de Guimarães a S. Nicolau, uma vez que, no livro Inventário Geral da Colegiada, relativo provavelmente a 1664 (tenho encontrado referências a este documento como sendo de 1564 ou 1654, mas parece-me seguro que é posterior, uma vez que a capela só começou a ser erguida em 1662), se lê o seguinte:
A Capela de S. Nicolau fizeram-na os Estudantes desta Vila e outros devotos de dinheiro que ganharam em comédias e danças que por devoção do Santo e aumento da Capela aceitavam o dinheiro que lhes davam.
Mas, de que se fala, afinal, quando se fala de danças e comédias?
Antigamente, por ocasião de festas religiosas ou outras celebrações públicas, como nascimentos e casamentos na família real ou visitas régias, havia o costume de organizar danças e folias (não é fácil distinguir umas das outras, de tal modo se confundem), que consistiam em manifestações de teatro de rua de raiz popular. No dicionário de Bluteau, encontramos a seguinte descrição das folias:
Entre nós folia vale o mesmo que festa de várias pessoas, tangendo e cantando com tambor e pandeiro, ou dança com muitas soalhas [chapinhas metálicas dos pandeiros] e outros instrumentos, com tanto ruído, extravagância e confusão que os que andam nela parecem doudos.
Em Guimarães, eram particularmente notáveis as danças e folias que acompanhavam a procissão do Corpo de Deus, que o Abade de Tagilde estudou: a dança do rei David, a dança da Judenga, a dança da Mourisca, a dança da pela, a dança dos instrumentos, a dança das ciganas, a dança dos azeiteiros (“muito boa, com sua música”), a dança dos tendeiros (dança de fitas), a dança dos linheiros (composta de dezasseis figuras, fora os tangeres, bem preparadas e vestidas, dança das pescadeiras (dez figuras, com dois tangedores), a dança dos mercadores do pano do linho (uma folia com dezasseis figuras, fora os tangeres, com muito aparato e bem vestidas), a folia das moças (“sete figuras, incluindo as violas e tambor, feita com toda a perfeição”). Encontram-se também referências ao Império de Maria Garcia, com suas danças e tangeres.
Estas danças e o seu financiamento eram objecto de atritos entre a Câmara, que organizava a procissão do Corpo de Deus, e aqueles que eram constrangidos a fazê-las. Em alguns casos, essas obrigações foram substituídas pela de assegurar umas quantas tochas para acompanhamento do cortejo. Algumas delas, como a dança da mourisca e a dança da judenga, pelo seu carácter de crítica social com contornos ofensivos e injuriosos, eram, frequentemente, alvo de censura. Em 1732, o corregedor ordenou o fim das danças e folias na procissão do Corpo de Deus, as quais foram substituídas por andores.
Não faltam exemplos de danças executadas em momentos não associados a actos religiosos. Assim foi, por exemplo, em meados de Maio de 1548, aquando da visita do infante D. Luís (filho do rei D. Manuel I). À chegada, tinha à espera uma dança mourisca de trezentos meninos, tendo por rei o seu mestre, João de Évora. Em S. Lázaro, saiu-lhe ao caminho entrada “uma dança de moças bem parecidas e concertadas, que dançavam muito bem, de que ele gostou, e lhe cantavam”:
Meninas de Alfama
Não vades ao chafariz
Bem sabeis as tretas
Do infante D. Luís.

Para alguns anos de meados do século XIX, não encontrámos referências às exibições de estudantes mascarados. Em alguns anos não houve mesmo festas a S. Nicolau: assim aconteceu em 1853, em virtude da morte da rainha D. Maria II. O mesmo sucederia em 1861, em luto pelo falecimento de D. Pedro V.
Sabemos que no 6 de Dezembro de 1856 houve cavalhadas e exibições, durante o dia. As danças concluíram-se no Teatro D. Afonso Henriques, com uma mascarada, quadros vivos e outros divertimentos.
Temos notícia de duas danças nas festas do ano de 1857, que recordaram o regresso de Vasco da Gama a Lisboa, depois da viagem à Índia: uma de damas, figurando o prazer de muitas belas pelo regresso dos heróis que lhes estavam destinados, outra de portugueses e melindianos, significando o prazer dos dois povos pela sua mútua amizade. À noite, houve espectáculo no Teatro, com a representação de duas peças, cujos intervalos foram preenchidos com danças e declamação de poesias.
Em 1858 voltou-se ao teatro. As danças foram assim descritas pelo jornal Tesoura de Guimarães:
Poucas foram as exibições que apareceram no resto do dia, mas algumas delas chistosas e picantes. A primeira foi a aparição de um fio eléctrico, com direcção a Braga, pelo qual se estavam recebendo notícias, que eram logo publicadas; entre elas uma recebida de Lisboa, que dizia – Guimarães vai ter tudo o que lhe falta: telégrafo eléctrico, biblioteca, estradas e até caminho-de-ferro, porque uma coisa tinha caído.
Outra era: duas damas, em carrinho descoberto, vestidas com mantos pretos e toucas na cabeça; seguidas de criados com riquíssimas librés. Atrás do carrinho ia um homem do povo, que o empurrava, como para andar mais depressa do que os cavalos o levavam. Na tábua do carrinho, quando o homem o empurrava, e na mão deste, ia um lampião aceso.
Outra compunha-se de quatro indivíduos, cobertos com dominós negros e com archotes acesos na mão, andando a toque de caixa.
Em 1859, em dia de S. Nicolau, as ruas de Guimarães foram percorridas por três danças de estudantes e por um engenhoso realejo.
Em 1862, houve dois bailes (danças) na tarde de 6 de Dezembro.
Fazer as danças nas festas da Câmara era obrigação dos diferentes ofícios, pelo que não se deve estranhar que também as houvesse de estudantes. Como vimos, foi com danças que os estudantes financiaram a construção da Capela de S. Nicolau. Esta será, aliás, a forma mais usual do financiamento da Irmandade de S. Nicolau, de acordo com o Cap. XV do respectivo Estatuto, de 1691, que estabelece que o “aumento desta Santa Irmandade consiste nas esmolas que se dão pelas Comédias e Danças”. As danças e folias eram, assim, um serviço que a Irmandade prestava a troco de pagamento, como aconteceu em 1730, quando a Colegiada despendeu cinquenta mil réis com uma “folia preta dos estudantes e dança preta”.
No século XIX, voltamos a ter notícia de danças organizadas pelos estudantes de Guimarães (aqui já sem referência à Irmandade). Temos notícias de duas no ano de de 1823. Nos dias 12 e 13 de Janeiro, os estudantes saíram mascarados, acompanhando um carro onde figurava o retrato de D. João VI, cantaram o hino e fazendo “uma brilhante dança”. No dia 31 de Agosto, no último de três dias de corridas de touros em honra do Conde de Azenha, as ruas de Guimarães foram percorridas por uma “vistosa dança”, feita pelos estudantes.

Na década de 1820, em plenas lutas liberais, os estudantes de Guimarães foram, várias vezes, proibidos de se mascararem no dia de S. Nicolau, conforme era seu uso. A tais interditos de referia, indirectamente, o pregão de 1828:
Festivas danças, lícitos folgares,
Não mancham o sagrado dos altares.
E no Pregão do ano seguinte, lia-se:

Máscara, exibição, festiva dança,
Que ao coração das Ninfas prisões lança,
É cacho que ninguém mais depenica.

A Revista Universal Lisbonense, periódico de António Feliciano de Castilho, descreveu, em 1843, as festas de S. Nicolau de Guimarães:

Máscara Histórica – A festa de S. Nicolau em Guimarães é popular e antiga na terra. Este ano foi ainda mais luzida do que nos precedentes. A dança dos mascarados principalmente, esteve muito para ver: entre outras figuras apareceu nela uma representando um egresso a pedir esmola aos ricaços, que herdaram todos os seus bens, estando ele ainda vivo! O pensamento foi aplaudido geralmente.

Em 1845, depois dos estudantes terem dirigido a sua ironia para os “engenheiros” que estavam a construir a estrada para o Porto, voltou as proibição, que, a instâncias dos estudantes, seria levantada pelo administrador do Concelho. Mas, se não foi a autoridade política, foi a chuva a prejudicar os festejos, impedindo a saída de uma “dança chinesa” no dia de S. Nicolau. Sairia à rua no dia 9 de Dezembro, juntamente com uma “dança dos pescadores”.
O pregão de 1852 refere-se às danças:

Nem só quem traz judia, e traz bigode,
As danças, as facécias gozar pode;
Verá qualquer lapónio as farsas belas,
Té de riso estalar pelas costelas.
Em 1863, houve, de tarde, duas danças: uma de camponeses suíços e outro em gosto caricato à Luís XIV. À noite, ocorreu um incidente, cujos protagonistas foram mascarados. Foi descrito da seguinte forma nas páginas do Religião e Pátria:

Foi o caso que, no domingo à noite, dois máscaras entraram no palacete do Ex.mo Snr. Conde de Azenha e aí parece que espalharam uns bilhetes insultantes e de atroz infâmia. Felizmente que já se não ignora quem foram esses indignos que assim abusaram de um recreio honesto e inocente para enxovalharem a veste cândida da classe a que pertencem; e é por isso, e porque não era de esperar outra coisa de quem não soube nunca o que são as praxes da boa educação, mas pelo contrário vive só pelos alcouces e neles tem aguçado a sua índole já de si mesma maldosa, que o nobre conde, e toda a população da cidade faz justiça à classe que eles tão infamemente ultrajaram com aquela sua acção malcriada e infame.

Em 1864, houve dois bailes de mascarados. Segundo o jornal O Vimaranense, um era composto de estudantes maiores e em gosto mais epigramático, outro de estudantes de mais tenra idade, vestidos a carácter com extrema elegância e que mais prendeu a atenção do público.

Os festejos de 1865 foram prejudicados pela chuva. No entanto, houve algumas exibições e duas danças a carácter, que entretiveram o público.
Os festejos de 1865 foram prejudicados pela chuva. No entanto, houve algumas exibições e duas danças a carácter, que entretiveram o público. 
Em 1866, novo incidente ensombrou as danças a S. Nicolau, que então já também se exibiam em algumas casas particulares. Foi noticiado pelo Vimaranense:
Os festejos escolásticos terminaram infelizmente por um desagradável incidente, que contristou toda a classe e mais pessoas que dele têm tido conhecimento.
Achando-se reunidas algumas famílias da sua amizade em casa do Ilm.º sr. Gaspar Ribeiro Gomes de Abreu na noite do último dia de máscaras, apareceram ali alguns estudantes mascarados e entre eles o nosso amigo José Baptista Felgueiras, filho do falecido Ministro de Estado João Baptista Felgueiras.
A entrada inesperada de um máscara, que evitava ser conhecido, suscitou a desconfiança nos estudantes presentes de que não pertencesse à classe, resultando daqui, como era natural, o desejo de o reconhecerem, desejo que, sendo contrariado, suscitou um reboliço que veio a terminar à porta da casa, onde foi gravemente ferido na palma esquerda o sr. Felgueiras ao aparar uma punhalada, que mão covarde e traiçoeira lhe despedia.
Este acontecimento causou o mais desagradável sentimento a todos que o presenciaram, tanto mais porque a vítima desta brutalidade é um excelente mancebo, de distinta educação, incapaz de ofender a ninguém e dotados dos mais nobres sentimentos.
A ferida não apresenta sintomas perigosos, apesar de ser profunda, e ter dado lugar a uma grande hemorragia de sangue.
No pregão desse ano, proclamou-se:
Vereis depois, vertiginosas danças,
Não só de gentis moços, mas de panças
– Garridos anciãos, que em tal festejo
Não querem de brincar perder o ensejo
Na tarde de 6 de Dezembro de 1867, saíram dois bailes e algumas exibições.
No ano seguinte, os festejos do dia de S. Nicolau seriam idênticos. Uma das exibições foi, então, especialmente notada, por lembrar que a festa estava a perder o seu antigo esplendor. Segundo o Religião e Pátria, vestiam de luto alguns mascarados, acompanhando, de archotes acesos, campainhas soando lugubremente e tambores cobertos de crepe, um carro em que vinham outros mascarados. Um dos mascarados recitava uma poesia que lamentava a mortal decadência da festa do S. Nicolau. Não faltaram susceptibilidades feridas por esta manifestação, havendo quem, à noite, saísse à rua, recitando versos insultantes e desbragados contra a exibição da tarde.
Em 1870, os estudantes desentenderam-se, tendo chegado a vias de facto. Mas, a crer no que se então escreveu no jornal O Vimaranense, a discórdia até resultou em benefício das Festas:
As escolásticas mascaradas, peculiares da nossa terra, apresentaram-se este ano muito mais luzidas, graças à justa travada entre os dois grupos discordes. Nenhum excedeu o outro em aparato e cordura, tornado ambos a velha festa excepcionalmente brilhante. Neste ano, em vez de um, foram declamados três pregões: dois pelas facções desavindas dos estudantes no activo e um terceiro pelos estudantes veteranos.
Entretanto, o célebre professor Venâncio tinha-se jubilado, deixando de haver aula de latim em Guimarães, o que ajuda a explicar o esmorecimento das festas a S. Nicolau, que por aqueles anos era uma evidência para os vimaranenses. Durante vários anos, não haveria danças.
Ao entrar no último quartel do século XIX, a morte das festas a S. Nicolau era notícia nos jornais, onde se ia dando conta do vazio e da saudade que a ausência das festas provocava na cidade. No Religião e Pátria de 9 de Dezembro de 1876 escrevia-se o epitáfio das festas dos estudantes:
O alegre, o folgazão, o garrido, o enamorado, o querido das damas, o secular festejo escolástico… morreu! Há anos que estava agonizante, e sempre para o ano futuro se lhe profetizava a morte. Agora, porém, foi certo.
Como deixa saudades aquele folgar de rapazes.
Em 1880, houve um arremedo de festas. No dia 29, passeou as ruas da cidade uma pequena música, que uns estudantes fizeram tocar para simular a espera do pinheiro. Então, nada houve que se assemelhasse às antigas danças.
Em 1881, com a abertura do Colégio das Hortas, voltaram a realizar-se as festas, mas sem o brilho de outrora. Na noite do dia 6, saiu à rua uma cavalhada, que durou até de madrugada, mas, segundo relata o Imparcial, sem que um único concorrente, um só daqueles estroinas filhos de Minerva soltasse um dito picaresco, alegre, digno, análogo, enfim, a tão jovial funzion!. De danças, nem sinal, portanto.
Em 1882, houve festejos escolásticos, que se limitaram ao bando, à entrega das maçãs e ao magusto. Em 1883, não seriam diferentes e, em 1884, não foram melhores. Escrevia-se no Religião e Pátria a propósito da festa dos estudantes de Guimarães a S. Nicolau: todos os anos pretende renascer, ou antes, dar sinal de que não morreu, mas a morte é cruelmente certa.
Nos anos seguintes, não haveria festas. Em 1888, alguns dos seus antigos entusiastas mobilizaram-se para um piquenique na Penha, em romagem de saudade aos velhos tempos.
Em 1892, as festas foram assinaladas pelo curso infantil de ambos os sexos da Sociedade Martins Sarmento, tendo na altura sido cantado o novo hino a S. Nicolau, composto por Domingos Calisto, professor daquele curso.
Em 1893, foi a vez do Colégio de S. Nicolau relembrar um pouco da antiga tradição. Realizaram um animado sarau literário-dramático, entrando em cena as comédias “Os operários em greve”, os “Dois teimosos” e os “Dois estudantes no prego”, que produziram grandes risadas nos espectadores.
Em 1894, os estudantes do Colégio de S. Nicolau voltaram a animar a cidade com os festejos do seu patrono. Todavia, como notava no Vimaranense, tais manifestações, que provocavam saudades, mais não eram do que um pálido reflexo dos festejos escolásticos de outros tempos.
1895 seria o ano do ressurgimento das festas a S. Nicolau. Regressaram em grande, com os antigos e os novos números. O seu momento mais alto seriam as danças dos velhos, como destacava o Religião e Pátria:
Mas o clou da festa foi, à noite, a dança dos velhos, – paródia ao coro das penas da opereta Drago a d'El- Rei. Imaginou-a, fez-lhe a chistosa e apropriada letra, e pô-la na rua, com os impulsos duma velha paixão e de um antigo entusiasmo, um nosso velho amigo. Muito bem e apropriadamente vestidos os “velhos foliões”, muito bem postos naquela mise en scene gaiata. Muito bem ensaiados, abriram-se-lhes, entre ruidosos e sinceríssimos aplausos, os salões da maior parte das famílias vimaranenses, e viram-se, nas ruas, sempre acompanhados de muitos centenares de pessoas até alta madrugada.
Em 1896, as festas, prejudicadas pela intempérie, saíram nos dias 6, 7 e 8 e incluíram um cortejo académico, que partiu da Escola Industrial. O Povo de Guimarães descreveu-o assim:
À frente os indispensáveis tambores e zabumbas; seguiam-se três académicos montados em bons cavalos, um dos quais empunhava a bandeira da academia; a filarmónica União executava o hino académico, precedendo-a a dança das lavradeiras e picadores. Fechava o préstito o carro triunfal conduzindo sobre uma enorme esfera a figura de Minerva empunhando um facho.
O cortejo percorreu algumas ruas da cidade, tendo terminado ao final da tarde. A dança que o integrou visitaria, em seguida, as casas das principais famílias de Guimarães.
As danças regressariam em 1897: no dia 6, desde as 8 horas da manhã, as ruas da cidade foram percorridas por uma engraçada exibição carnavalesca. A meio da tarde, saiu um grupo de danças do Teatro. Depois de se exibir pelas ruas da cidade, visitou, como então era costume, algumas casas particulares.
Em 1898, as festas incluíram uma dança, cujos protagonistas eram os principais jornais do país, sem faltar o Diário do Governo. Exibiu-se, cantando e dançando, pelos largos da cidade e em casas de algumas pessoas mais gradas, recolhendo de madrugada.
No ano de 1899, as danças realizaram-se durante a noite, em casas particulares. Segundo o Vimaranense, estiveram deslumbrantes.
No ano seguinte, apesar de prejudicadas pela chuva, as danças estiveram em bom nível. Foram ensaiadas por Albano Belino. Segundo O Comércio de Guimarães, saíram já noite fechada exibiram-se no Club Comercial e na Assembleia Vimaranense com grande concorrência de sócios e pessoas de suas famílias e também percorreram muitas casas particulares.
Em 1901 as danças representaram O pagode chinês. Os estudantes “aposentados” (velhos) também apresentaram, pelas ruas e casas particulares, uma dança sua.
Em 1902, havia de novo quem temesse pela vitalidade das festas. As danças, segundo O Comércio de Guimarães, não corresponderam às expectativas.
Todavia, no ano seguinte, tendo com ensaiador o Padre Gaspar Roriz, as danças foram primorosas, cheias de chiste. No entanto, foram poucos os que a elas assistiram, devido à inclemência da chuva. Tiveram como tema a Aliança luso-britânica. Narra o Independente que foram representadas em diversas casas particulares e também no coreto do jardim do Toural, a fim de que o nosso bom povo, que tanto ama estas festas, pudesse ver e por ser impossível, por causa da chuva, dançarem nas rua.
Também prejudicadas pela chuva, as festas de 1904 foram tristes e pouco animadas. Segundo O Comércio de Guimarães, as danças, que eram hoje o entusiasmo dos estudantes e das gentis crianças, tornaram-se em água a potes.
No ano seguinte, as danças recuperaram o seu brilho. Saíram do Teatro D. Afonso Henriques e exibiram-se em várias casas, praças e ruas da cidade.
Em 1906, as danças de S, Nicolau afirmaram-se como o número mais brilhante das festas nicolinas. Foram representadas por um grupo de foliões que se intitulava Grande Companhia Académico-Cómica-Cântico-Dançante e que era dirigido por Fernando Chaves. Saíram às 15 horas, iniciando o seu percurso com exibições nas ruas e terminando em casas particulares.
De acordo com a imprensa local, as danças de 1907, que decorreram nos moldes das anteriores, também terão sido do agrado geral.
Em 1908, tiveram A. L. de Carvalho como autor do texto e ensaiador. O desempenho dos estudantes, assim como o respectivo guarda-roupa, foram bastante elogiados na imprensa.
Em 1910, com a República implantada havia apenas dois meses, as Nicolinas decorreram em ambiente revolucionário. Não faltaram críticas às festas, da parte de alguns republicanos, que lhes chamaram carnaval em Dezembro e exigiram a sua reforma, para que se adaptassem aos novos tempos. Como se tal não bastasse, as primeiras festas em tempo de República foram ensombradas por uma tragédia: ao ser erguido, o pinheiro acabou por cair, matando uma criança de doze anos. As danças, com o título Os Revoltosos de 5 de Outubro, foram ensaiadas por Jerónimo Sampaio e, segundo o periódico monárquico O Comércio de Guimarães, fizeram a apologia da República. Encerraram com espectadores e estudantes a cantarem A Portuguesa. João Lopes de Faria escreveria, nas suas Efemérides Vimaranenses, que as festas de 1910 foram todas republicanadas.
Segundo o jornal Ecos de Guimarães anunciava, as danças de 1926 seriam escritas pelo Padre Gaspar Roriz e exibidas nos largos principais, para assim obedecer a uma velha praxe e satisfazer a curiosidade do povo que pela linda festa académica teve sempre a mais enternecida simpatia. Todavia, não chegaram a realizar-se, por falta de música.
Voltariam em 1927, de novo pela pena do Padre Roriz. Foram noticiadas assim no Comércio de Guimarães:
As danças, cuja letra pertencia ao velho entusiasta das festas o rev. Gaspar Roriz, mereceram como sempre, simpatia e aplausos.
Os rapazes andaram regularmente, apresentando-se bem postos, principalmente as “galantes” demoiselles, de saias pelo joelho e braços nus...
No teatro, aonde se exibiram a 1.ª vez, pela aglomeração de povo, estiveram iminentes alguns conflitos, que se não teriam dado se a força pública tivesse presidido desde a abertura da porta.
Em 1928, a Academia tinha sido seriamente afectada pela retirada de Guimarães do 6.º e do 7.º anos. Não obstante, realizaram-se as festas Nicolinas. As danças, com o título Os braços da Vénus do Milo, foram escritas por Jerónimo de Almeida. Segundo o Comércio de Guimarães, não foram tão vistas como nos anos findos, porque quase limitaram o seu raio de acção aos teatros. A novidade de as danças apenas terem sido executadas em recinto fechado resultou da necessidade de obtenção de receitas, por a subscrição para as festas não ter rendido o suficiente.
Em 1929, as festas estiveram fracas, apesar do reforço de uma delegação de estudantes que haviam feito os estudos preparatórios no liceu de Guimarães e que então frequentavam a Universidade do Porto. Não houve danças.
Em 1930, houve festas completas. As danças agradaram, embora fosse notório que necessitariam de mais ensaios.
As danças de 1931, com o título O Minuete, foram montadas por Jerónimo de Almeida, com a colaboração musical de António Guise. Neste ano, as festas não tiveram o brilho de outras eras. A retirada do 6.° e 7.° ano de Guimarães deu um golpe formidável nestas festas, escrevia-se no Comércio de Guimarães, segundo qual, no entanto, as danças fecharam com chave de ouro estes alegres festejos:
Por duas vezes se encheu literalmente o teatro Gil Vicente, na ânsia de presenciar o melhor número das festas Nicolinas.
A letra destas, bem como do bando escolástico, pertencia, como já dissemos, ao nosso amigo o snr. Jerónimo Almeida, que firmou o justo conceito em que era tido. Muito finas e mimosas e do mais belo efeito.
Os estudantes estavam bem ensaiados e optimamente vestidos.
Nas danças, alguns pares salientaram-se pela maneira donairosa e elegante como executavam alguns passos, merecendo aplausos.
No final, e após prolongados aplausos, foram chamados ao palco, aonde receberam justas ovações, pelos seus trabalhos, o snr. Jerónimo Almeida, o ponto, e o snr. António Guise.
Há ainda a salientar a distinta colaboração do novel professor de música o snr. Manuel Marques Ferreira, que acompanhado do snr. António Guise, foi incansável para o bom êxito das danças.
e 1932 a 1941, as Nicolinas não incluíram aquele que, por muitos, era considerado o seu número principal, as danças.
Em Dezembro de 1938, Maria Eduarda escrevia no seu Bilhete Postal, coluna que manteve durante largos anos no Comércio de Guimarães:
As festas Nicolinas viveram a sua época, pertencem ao Passado.
Os seus melhores números, aqueles que iluminaram os nossos salões e foram o encanto da mocidade, não podem reviver, não! Levou-as a alma Académica. São flores murchas, crachás decorativos, que não encontrariam na nossa época o ambiente necessário.
Em 1942, as Nicolinas homenagearam José de Pina. Houve danças, que repetiram (pela terceira vez) as letras escritas por Bráulio Caldas para a edição de 1901 das danças dos velhos. Terão sido exibidas no Liceu, no Internato Municipal, possivelmente no Teatro Jordão e em algumas casas particulares.
Em 1943, houve festas incompletas, porque lhes voltaram a faltar as danças.
Em 1944, regressaram as danças, com letra de Delfim Guimarães. Segundo a imprensa, terão agradado.
No ano seguinte, uma comissão de velhos tratou de não deixar passar em branco o cinquentenário do ressurgimento das festas. O programa encerraria no dia 6 de Dezembro, com um Sarau de Gala no Teatro Jordão. Segundo os jornais, o teatro registou uma enchente como não havia memória, tendo-se realizado uma segunda representação, na segunda-feira seguinte. Subiu ao palco a revista Guimarães... Monumental, escrita por Filipe e Leão Martins. Neste ano houve danças dos estudantes novos, com texto de Delfim Guimarães.
As danças continuavam a realizar-se intermitentemente. Houve-as nas Nicolinas de 1947. Em 1951, as festas incluíram as danças, número que há muito não se fazia.
As festas de 1953 fizeram-se com danças, exibidas no Teatro Jordão, na sede do Grémio do Comércio, em algumas casas particulares, no Toural, para que o povo as pudesse admirar, e mesmo, mais tarde, em Pevidém.
Depois deste ano, voltamos a ter notícias de danças nicolinas no ano de 1960, as quais que foram escritas por Francisco Costa, e em 1964, com texto de João Xavier de Carvalho. Regressariam em 1972, com texto de A. Meireles Graça.
Nos 41 anos que durou o Estado Novo (1933-1974) apenas houve danças em oito edições das Festas Nicolinas. Os tempos não iam de feição para a livre expressão que sempre caracterizou esta manifestação dos estudantes de Guimarães.
Depois de onze anos de interregno, as danças regressariam em 1983, sob a batuta de Óscar Machado e com argumento de A. Meireles Graça.
Regressariam em 1986, para ficar. O autor das danças, definitivamente assumidas pelos velhos, seria, durante vários anos, A. Meireles Graças, que contou com várias colaborações.
Em 1992 seria a vez de uma equipa composta por Novais de Sousa, Fernando Capela Miguel e Rolando Sampaio.
A partir de 1996, entrou-se num novo ciclo, dirigido por Miguel Bastos, que assume direcção artística e a escrita do roteiro, a quem se foram associando outros autores de textos (no início, Rolando Sampaio e Ricardo Gonçalves).
E assim se vão fazendo as Danças que os estudantes de Guimarães, novos ou velhos, dedicam a S. Nicolau há mais de trezentos anos.
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