Arquivo: A Capela Original de S. Nicolau

Num códice guardado no Arquivo Municipal de Guimarães, pode ler-se que "a Capela de São Nicolau fizeram-na os Estudantes desta Vila e outros devotos de dinheiro que ganharam em comédias e danças que por devoção do Santo e aumento da Capela aceitavam o dinheiro que lhe davam".
Craesbeeck deixou escrito que a Capela de São Nicolau foi "instituída pelos Estudantes, que fabricam com sua Irmandade". Refere ele que a Capela "no friso tem este letreiro, por que consta o sobredito:
"Esta Capela mandaram fazer os Estudantes / Desta Vila no ano do Senhor de 1663"
Já antes o Padre Torquato e Padre Carvalho deixaram registada a mesma informação. O Capítulo XIII dos Estatutos da Irmandade, de 1691, intitulado "do anal que se há-de dizer todos os domingos", diz concretamente que "a Mesa será obrigada a mandar dizer dos juros do dinheiro uma Missa todos os domingos pelos Irmãos e Benfeitores da Capela vivos e defuntos...".
Também os Capítulos XIV a XVI dos mesmos Estatutos se ocupam da regulamentação da participação dos Estudantes nas ditas comédias e danças. Estas eram de facto importantes para o aumento da Irmandade, tal como já o haviam sido para a sua instituição e edificação da Capela de São Nicolau.
Sabemos, por estas vias, que foram os Estudantes que mandaram construir a Capela de São Nicolau, servindo-se para isso do contributo de benfeitores e ainda do dinheiro obtido com a realização de comédias e danças.
Tal como se impunha, os Mordomos da Irmandade dirigiram-se aos membros do Cabido, por petição de 20 de Maio de 1662, referindo-lhes que "de muitos anos a esta parte tinham tenção e devoção de fazerem uma Capela da invocação do Glorioso São Nicolau Bispo, para nela levantarem Confraria e Irmandade à honra e louvor de Deus e aumento do culto divino; e porque nesta igreja de Nossa Senhora da Oliveira era lugar mais conveniente para edificação da dita Capela, lhes pediam aos ditos Reverendos Senhores do Cabido lhe fizessem mercê do sítio para ela".
A notícia da resposta do Cabido vem a seguir: "Convieram em lhes dar licença junto da porta travessa da dita igreja, da parte direita dela, encostada à Sacristia, junto à Capela de Santo Estêvão, no quintal que é do Sacristão, na forma que contratado tinham com o mestre que tomara a obra da dita capela, e lhe largavam o dito sítio, de hoje para todo o sempre"  .
Deste modo o Cabido foi de encontro aos desejos dos Mordomos e concedeu-lhes a devida licença para que a Capela de São Nicolau se sediasse na Igreja de Nossa Senhora da Oliveira. O termo é assinado por André Gomes, Padre João da Silva Salgado, Francisco Mesquita da Cunha, João Cardoso Soares, Domingos de Freitas, Marcos de Figueiredo, Francisco Barbosa, Padre Tomás da Silva, Padre António Ribeiro e João Pereira do Lago.
A construção da Capela foi tratada para custar, "na forma sobredita perfeita e acabada", duzentos e vinte mil reis em dinheiro de contado. O pagamento dos serviços do Mestre de Pedraria encarregue da obra bem como das despesas feitas seria satisfeito, como o citado contrato refere, do modo seguinte: cinquenta mil reis pagos de entrada (o Mestre declarou com recibo já os ter recebido); quinze mil reis seriam pagos no dia seguinte; o restante "lhe irão dando conforme ele for correndo com a obra, e sendo caso que lhe faltem no pagamento não correrá com a obra até lhe irem satisfazendo"
A sua construção fez-se entre 1662 e 1663.
 
Localização, dimensões, construção e demolição da Capela de São Nicolau:
Lê-se, no texto do contrato entre os Mordomos e o Mestre de Pedraria para a construção da Capela (datado de 21.11.1661), que esta seria levantada do lado direito da igreja, "encostada à Sacristia, junto à Capela de Santo Estêvão, no quintal que é do Sacristão".
Como se infere pelo citado contrato, o referido quintal do Sacristão não estava livre, mas ocupado com 'obra', que seria retirada, sendo a pedra disponível aplicável na edificação da Capela.
A Capela teve esta localização, referida pelo Padre Torquato de Azevedo (as suas "Memórias Ressuscitadas..." são de 1692): "Na parede da Igreja da parte do Evangelho e do norte e abaixo da porta por onde se sai da Igreja para a Sacristia dos Cónegos, se abriu um arco para a Capela de São Nicolau Bispo que instituíram os Estudantes desta Vila de abóbada de pedra apainelada e azulejada com o corpo fora das paredes e porta livre para a Igreja e sobre ela um epitáfio que diz-  Esta Capela mandaram fazer à sua custa os Estudantes desta Vila no ano do Senhor de 1663 -  tem nela sua Confraria por cuja conta corre a fábrica dela; entre esta capela e a escada que vai para o coro de cima está a porta travessa da igreja que corresponde ao norte e tem a sua serventia para a rua que chamam da Santa Maria".
O Padre Carvalho da Costa (em 1706) relata que "abaixo da porta que vai para a Sacristia, no lado da parede da parte do Evangelho, se abriu um arco de pedra para a Capela de São Nicolau Bispo, que instituíram os Estudantes daquela Vila, e a fabricam por sua Confraria: é toda azulejada, de abóbada de pedra apainelada, com o corpo fora das paredes, e no friso do arco um letreiro que diz: Esta Capela mandaram fazer os Estudantes/desta Vila no ano do Senhor de 1663. Abaixo dela está a porta travessa desta igreja que vai para o norte e tem a sua serventia para a praça" .
E Craesbeeck (1726) transcreve o mesmo letreiro do friso e notifica deste modo a existência da Capela: "Abaixo desta Capela [do Espírito Santo] está outra, no corpo da igreja, que é de São Nicolau, instituída pelos Estudantes... (...) Abaixo fica a porta, por onde se sobe para o coro; e logo mais abaixo a porta travessa, da parte do noite..."
Em 1758, confirma-se a existência da Capela de São Nicolau, e ainda a dos seguintes altares  : na igreja, os do Espírito Santo, do Senhor da Agonia e de Sant'Ana; e no Claustro, os de Nossa Senhora da Pombinha, de São Roque, dos Santos Cosme e Damião, do Senhor Descido da Cruz e de Santo André.
A igreja, velha e antiga do tempo de muitos anos, tem "sete altares dentro dela e no claustro outros sete, nos quais alguns são capelas, como a do Santíssimo Sacramento com a Sua Confraria, a do Senhor Jesus que é da Casa de Vila Pouca, com obrigação de Missas, a de Nossa Senhora da Conceição da Casa do Proposto, também com obrigação de Missas, e estes administradores moram nos subúrbios desta mesma Vila, a de São Nicolau com Irmandade, todas estas na igreja..." (Padre Luís Cardoso Diccionário Geográfico, Vol. XVIII, n.° 134 fl. 745, manuscrito da Torre do Tombo, transcrito em Maria Clara Pereira da Costa, "A Comarca de Guimarães - Séculos XVI a XVIII", in Actas do Congresso Histórico de Guimarães e sua Colegiada, Vol.Ill, p. 403. e ainda Craesbeeck, Memórias Ressuscitadas, Vol. I, p. 139) estava em curso uma "nova obra", na Igreja da Colegiada, e em que o Cabido perguntava se a Irmandade estava de acordo com "a reforma da Capela de São Nicolau". A Mesa respondeu que sim, pondo condições (a obra ser feita à custa do Cabido; a Irmandade continuar a "ser Senhora do terreno da mesma Capela, para nela poder fazer a sua Sacristia ou outra qualquer obra que lhe convenha"; não se instituírem servidões; o "tapamento divisório" ser feito "à custa do mesmo Elm.° Cabido"; a Mesa dispusesse de uma chave da "porta principal da entrada para a Sacristia dessa sua Capela").
Em acta de 22.01.1839, lavrada no mesmo livro, decidiu-se a construção urgente de uma Sacristia, "pela parte de trás do nosso altar aonde antigamente se achava o mesmo", com um cofre para guardar "as preciosidades e dinheiros" da Irmandade.
Ao tempo do Padre Ferreira Caldas (1881), a igreja tinha 8 altares no corpo da igreja, 4 de cada lado, com 8 retábulos da autoria de Joaquim Rafael.
Albano Belino (1900) fala em quatro altares na nave: Sant'Ana, Nossa Senhora da Conceição, Espírito Santo e São Nicolau; e lembra que a Capela de São Nicolau "não tem culto desde que construíram na sua frente o altar da mesma invocação". Esse altar é encorpado por um retábulo executado em 1848 por Joaquim Rafael
Em sessão extraordinária da Mesa , são referidos "melhoramentos introduzidos na nossa Capela privativa, pelos quais a vemos completamente transformada". Agradece-se em especial a Alfredo Guimarães, director do Museu Alberto Sampaio, pela cedência que fez à Irmandade de um altar e umas grades para a Capela. João Mendes Fernandes ofereceu uma lápide em mármore e foi ainda mandada fazer, para "comodidade da Igreja", "uma porta com vidraça, a qual aqui fica consignada que é pertença da Irmandade". Para a colocação dessa porta, que fecharia o acesso à torre (e à Capela) foi solicitada autorização aos Monumentos Nacionais.
É deste modo que a Capela de São Nicolau é referida por Sant'Anna Dionísio: "contíguo ao altar de São Nicolau (outrora um dos absidíolos da igreja joanina), existe uma capela de abóbada de granito, polinervada, erigida nos meados do séc. XVII pela Academia Vimaranense".
A localização da Capela em relação ao altar é igualmente documentada pelo citado número 128 do Boletim dos Monumentos Nacionais: "A Capela de São Nicolau, nas traseiras deste altar e virada   ao exterior, desapareceu com as obras de restauro". E confirma-se aí ter sido ela "toda abobadada de pedra, apainelada" e que existia no arco a inscrição "Esta Capela mandaram fazer os Estudantes / desta Vila no ano do Senhor de 1663", e ainda a outra, "Pedra fundamental da / Capela de S. / Nicolau no /.anno de 1662".
Apesar das transformações operadas, não foi encontrado documento algum que permitisse concluir que a Capela, ao longo da sua existência de pouco mais de trezentos anos, e à parte intervenções não estruturais, tenha sido alterada nas suas dimensões. Aliás, os Monumentos Nacionais garantem ter encontrado no seu friso a inscrição já referida por Padre Torquato, Padre Carvalho e Craesbeeck. Não há notícia de que as várias modificações operadas na igreja, nomeadamente as que, em 1830, prepararam o espaço para a colocação dos retábulos, tenham interferido com a Capela.
Por isso consideram-se as dimensões da Capela invariáveis ao longo do tempo.
Pelas plantas publicadas pelos Monumentos Nacionais, verifica-se que a Capela de São Nicolau tinha aproximadamente 3,2 x 4,3 metros, de dimensões interiores, e 4 x 6,3 metros, de dimensões exteriores. Um termo de comparação interessante, estabelecido e mais que uma vez referenciado no instrumento de contrato e obrigação de 21 de Novembro de 1661, acima citado, é a Capela da Persiúncula, corruptela de Porciúncula , nome por que, originariamente, ficou conhecida a primeira casa da ordem franciscana, nas imediações de Assis.
Referindo a Porciúncula, diz o texto do citado contrato, que precedeu a construção da Capela:
1)    .. "e que o arco e capela terão mais cinco palmos de alto que a Capela de Porciúncula de São Francisco";
2)    .. "e terá a Capela dentro em vão mais três palmos de comprido e três de largo que a dita Capela da Porciúncula";
3)    ..."a Capela terá de comprimento mais dois palmos do que acima fica dito, que vem a ser cinco palmos mais em vão ao comprido que a dita Capela da Porciúncula".
Estará esta alusão à "Capela de Porciúncula de São Francisco" a querer visar directamente a Porciúncula de São Francisco?
Antes de procurarmos uma resposta para essa pergunta, talvez não seja descabida uma alusão sumária ao que foi a original Porciúncula de São Francisco.
Essa "igrejinha, ou porção de igreja, dada por esmola ao penitente de Assis para núcleo da sua congregação nascente", encontra-se integrada na vertical do centro da cúpula de Santa Maria dos Anjos-uma das maiores Basílicas de Itália e do mundo, nas proximidades da cidade cor-de-rosa, como é conhecida Assis.
E um "tugúrio humilde, ou antes pobríssima choça de pedras toscas, e de portas e janelas estreitas, que se conserva no centro da igreja e debaixo da sua arrogante rotunda" .
A designação de Porciúncula (do latim portiuncula, porção mínima, coisa pequena), aplicada à Capela de São Francisco de Assis (esse Santo que desempenhou um papel extraordinário em favor da paz, no mundo e nas almas"  ), embora não tivesse sido originariamente levantada por São Francisco, não destoava em relação ao amor que o Santo sempre manifestou pelas coisas simples e insignificantes. Ela era, antes de se prestar a 'oratório' do Santo, uma capelinha arruinada, pertença dos Beneditinos.
A Capela é assim descrita por Johannes Joergensen;
"A antiga capelinha da Porciúncula, tal como se conservou até nós, é uma construção de forma oblonga com uma abóbada gótica, uma ábside semicircular e duas portas, uma das quais, que é em arco, mas muito simples, se abre na frente da igreja, e outra numa parede lateral. Segundo uma tradição mencionada pela primeira vez no Paradisus Seraphicus, de Salvador Vitali (Milão, 1645), esta capela foi construída no século IV, durante o pontificado do Papa Libério, por quatro eremitas que tinham regressado da Terra Santa com uma relíquia do túmulo da Virgem, que São Cirilo lhes tinha dado. (...) O nome da capela, também muito antigo, vem de um quadro que se encontra por cima do altar e que representa a Assunção da Virgem com muitos Anjos. Quanto à palavra porciúncula, "pequeno lote de terra", tinha sido empregue primeiramente pelos beneditinos do monte Subásio, a quem esta capela sempre tinha pertencido desde 576. Em 1075, o edifício estava de tal maneira arruinado que os frades o tinham abandonado para se juntarem a outros na capela do alto da montanha."  .
São Francisco solicitou a capela aos beneditinos e reedificou-a com a ajuda dos seus companheiros. Passou a ser esse o espaço onde os monges descansavam, no regresso das suas viagens apostólicas, e se reuniam em Capítulo.
Era também lá que a vontade de Deus se lhes revelava  .
A Porciúncula foi sagrada em 2 de Agosto, provavelmente de 1216, sendo concedida, daí a cinco anos, pelo papa Honório III, indulgência plenária aos fiéis que lá se deslocassem nesse dia em espírito de penitência.
A origem da indulgência (também chamada o perdão de Assis) é pouco clara. Segundo uma lenda, deveu-se a que São Francisco, para resistir à tentação, atirou-se para cima de umas roseiras bravas. Deus mandou logo dois Anjos que o levaram para a
Porciúncula, onde lhe apareceu Jesus, acompanhado de Nossa Senhora, a quem o Santo pediu que todos os arrependidos que entrassem naquele lugar fossem absolvidos dos seus pecados.
Então, e retomando a pergunta feita: no citado instrumento de contrato e obrigação, assinado entre os Mordomos da Irmandade de São Nicolau e o Mestre de Pedraria que edificou a Capela, ao falar-se na "Capela de Porciúncula de São Francisco" estar-se-á a querer referir directamente a Capelinha integrada em Santa Maria dos Anjos?
Para maior facilidade de comparação, consideremos apenas o comprimento e a largura atribuídos à Capela nesse contrato. Valendo o palmo o equivalente a 8 polegadas, ou 0,225 m , teríamos que a Capela de São Nicolau mediria, no seu interior, mais 1,125 metros (5 palmos x 0,225 m) de comprimento e 0,675 metros (3 palmos x 0,225 m) de largura que a tal Capela da Porciúncula-  o que muito dificilmente se não repercutiria nas suas medidas exteriores.
Ora, nós sabemos que a Capela que a pessoa de São Francisco de Assis imortalizou tem por dimensões 14 passos por 7, de medidas exteriores  , e valendo o passo o equivalente a dois pés e meio, ou 82 cm  esses valores seriam muito aproximadamente de 11,5 m por 5,8 m.
Como se repara, não é possível a Capela da Porciúncula referida ser a de São Francisco, pois esta é consideravelmente maior que a de São Nicolau.
Para que assim fosse, a Capela de São Nicolau dos Estudantes deveria ter, no seu exterior, aproximadamente 12,625 m de comprimento (11,5 m + 1,125 m) por 6,475 m de largura (5,8 m + 0,675 m), o que se desvia da realidade.
Afastada a possibilidade de esta referência à Capela da Porciúncula ter a ver com a Capela integrada em Santa Maria dos Anjos Junto a Assis, há que procurar a capela que no designado documento é citada pelo mesmo nome. Existe referência a uma, que seria forçosamente de dimensões muito reduzidas (cerca de 4,5 m-1,125 m por 3,5 m-0,675 m, ou seja, 3,375 m por 2,825 m), que existiu no Convento de São Francisco de Guimarães, designada por "Capela de Nossa Senhora da Porciúncula".
O Padre António Carvalho da Costa refere-se a essa Capela. Diz ele que António Dias Pimenta e sua mulher, Maria Peixota, instituíram vínculo "com Capela de Nossa Senhora da Porciúncula no Convento de São Francisco de Guimarães". Mas, para além desta referência, ele não especifica concretamente de que Capela se trataria, na descrição que faz do Convento dc São Francisco. Ele atesta a existência de um certo número de Capelas. São elas, na igreja: a Capela de Nossa Senhora do Ó ("do lado da parede da parte da epístola"), a Capela de Nossa Senhora da Embaixada (abaixo da anterior), a Capela de São Francisco e São João Baptista, a Capela de Santa Anastácia, a Capela de Jesus, a Capela do Descendimento, a Capela de Santo António, a Capela das Chagas de Cristo (da Confraria do Cordão), a Capela de Nossa Senhora da Conceição (de 1678: "encostada à parede do arco da capela-mor, que a divide da de Jesus, da parte do Evangelho, está a Capela de Nossa Senhora da Conceição, que a administram seus confrades"). No claustro, "para a parte sul", "debaixo do dormitório dos religiosos", ficava a Capela do Capítulo (instituída por Gonçalo Dias de Carvalho), e outra Capela de Nossa Senhora (na parte sul do Claustro, debaixo do dormitório dos religiosos, junto à Capela do Capítulo, "que instituíram, com dois arcos de pedra para o claustro, Pedro Vieira da Maia e sua mulher Brites Lopes de Carvalho").
Refere-se à mesma Capela Craesbeeck, dizendo: "a Capela de Nossa Senhora da Porciúncula, que instituiu Maria Peixoto de Freitas, viúva de António Dias Pimenta, em 22 de Março de 1629, por escritura feita nas notas de Francisco Nogueira, Tabelião e Chanceler desta Correição, o que fez com o Cónego desta Colegiada António Dias Pimenta, sobrinho do dito seu marido, que acrescentou o vínculo, por escritura de 18 de Agosto de 1631, nas notas do Tabelião João Abreu, desta Vila; e, por não terem entre si filhos, nomeou a dita Capela em Simão Dias Pimenta, Irmão do dito seu marido..." .
E o Padre Caldas refere que "António Dias Pimenta e sua mulher Maria Peixoto instituíram vínculo com Capela da Porciúncula no Convento de São Francisco e o nomearam em seu sobrinho António Dias Pimenta . Foi seu administrador José da Costa Pimenta com casas na Rua de Santa Maria".
Pelo que é possível concluir, a referência que é instituída para a edificação da Capela António Carvalho da Costa, Corografia, Vol. I, p.70.
A igreja do Convento de São Francisco teve 3 fundações: 1ª no lugar de Vila Verde, Urgeses, onde permaneceu cerca de 80 anos ("em Guimarães, junto da Vila, em uma serra a que chamam Vila Verde", São Guálter "fez uma habitação pobre e humilde"-  D. António Caetano de Sousa, Àgiologio Lusitano, Vol. 4, p.398); 2ºjunto à porta da Torre Velha, contígua a "um hospital que chamam do Anjo, situado na Rua do seu nome, que é hoje recolhimento de Beatas da Ordem de São Francisco, donde o mandou derrubar EL-Rei D. Dinis pelos anos 1200" (Padre António Carvalho da Costa, Corografia, Vol. I, p.58); 3º no local onde já está, em princípios do séc. XVI (ver Jornal Noticias de Guimarães, de 23.01.1971, artigo assinado pelo então notário vimaranense, falecido cm 04.09.94, com 82 anos - Notícias de Guimarães, de 30.09.94 - Luís Filipe Aviz de Brito). Ao longo dos tempos, houve interferências várias no edifício, sendo a mais importante a que se operou entre 1746 e 1749 (Maria Adelaide Pereira de Moraes, Guimarães. Terras de Santa Maria, p.10). Contemporaneamente a nós, também os Monumentos Nacionais intervieram no Monumento.

Conclui-se assim que a referência instituída para a edificação da Capela de São Nicolau deve ter sido, pelo menos quanto a dimensões, a Capela de Nossa Senhora da Porciúncula, em São Francisco, construída alguns anos antes. Esta Capela não terá sobrevivido à grande reforma da igreja operada entre 1746 e 1749.

Quanto à conclusão da obra, o Mestre comprometia-se a dá-la como pronta por todo o mês de Agosto do ano seguinte (1662), prazo que seria prorrogável se porventura ele viesse a estar doente.
Como garantias, estabelecia-se que, se porventura o Mestre falecesse sem ter acabado a obra, "se avaliará a que estiver feita a respeito do dito preço principal e o demais dinheiro que tiver recebido em seu poder por conta dela, seus herdeiros serão obrigados, e a mulher o herdará dele Domingos Lourenço a satisfazer o dinheiro que demais tiver recebido. E se mais montar a obra até aí feita, se lhe satisfará".
Segundo informação já acima referida, sabemos que o friso do arco da Capela comportava a inscrição que indicava que a capela havia sido mandada levantar pelos Estudantes, no ano do Senhor de 1663.
Sabe-se da existência de uma outra inscrição, também já referida, que dizia:
"Pedra fundamental da /Capela de S. /Nicolau no/anno de 1662".
Essa data de 1662, intermédia entre 1661 e 1663, poderá muito bem ser registo do início da construção.
De qualquer modo, o prazo estabelecido para conclusão da obra da Capela não foi efectivamente cumprido. A Capela só veio a ser concluída um ano mais tarde que o previsto, em 1663. Que teria acontecido para se operar tal atraso? Provavelmente, o que é de todos os tempos acontecer com obras deste tipo. Terá faltado matéria prima, o Mestre terá demorado algum tempo mais na realização de qualquer pormenor, ou então (o que é sempre o mais plausível) o dinheiro escasseou.
Terá sido nessas dificuldades que se deitou mão de fundos conseguidos com a representação das comédias e danças, como já foi referido acima, pelos Estudantes, conseguindo-se desse modo, moeda a moeda, a importância necessária.
E após todas estas diligências a Capela ficou no seu lugar ao serviço da Irmandade. Assim se iria manter, ainda que com altos e baixos, até ao final da década de 70 do século passado.

As obras eram apontadas como indo "contribuir para o bom funcionamento dós serviços do templo e restituir a este monumento a definição das várias épocas por que passou durante os séculos... Assim, com o fim de se prosseguir as obras, elaborou-se este processo relativo aos trabalhos de demolição da Capela de São Nicolau a Norte da nave, anexo adossado à parede do mesmo lado na capela-mor...". Assina o Arq. Bessa.
Em termos de demolições, ficou registado na "relação dos trabalhos efectuados" publicada no Boletim dos Monumentos Nacionais, que na globalidade da obra, se procedeu às seguintes: "demolição da parede de grossura do cunhal sul-poente, das construções adossadas à nave pelo lado norte e sul, da Capela de São Nicolau adossada à colateral norte, do anexo do mesmo lado encostado à capela-mor e transepto e dos tectos em estuque das naves, transepto e antecâmara".
Em fase já bem definida da realização das obras, em 30 de Novembro de 1971, um grupo de vimaranenses apresentou ao Ministro da Educação Nacional uma exposição, pela qual tomava posição face às transformações que se estavam a operar na Colegiada.
Nessa altura, o 'grupo de vimaranenses' denuncia "com profunda mágoa" que as obras de restauro estão suspensas e que "se lhes pretende imprimir determinado rumo com o qual não podem estar de acordo".
Dizem que "nunca se pensou em solicitar um restauro do tipo da chamada reconstituição integral, hoje absolutamente posta de parte em todo o mundo civilizado".
Reconhecem que "houve necessidade, para salvar as estruturas do templo, de destruir grande parte da obra oitocentista ali realizada", mas "o refazer esta no seu fácies decorativo constituiria uma atitude tão ultrapassada como a de, por exemplo, refazer a escultura de um capitel românico ou gótico desaparecido. Porque, evidentemente, tão condenável é fazer falso românico ou falso gótico como falso neoclássico".
Consideram-se "dentro da doutrina actual que preconiza a conservação dos enriqueci¬mentos e transformações que cada época trouxe a um determinado monumento. Ora essas transformações fizeram-se sempre em obediência a critérios de validade inteiramente epocais, muitas vezes causando destruições, e que nós hoje temos todo o direito de julgar segundo os nossos critérios e valores actuais".
Acham que se deve valorizar a arquitectura mais que a decoração, sacrificando-se mesmo esta àquela.
Propõem que "seja integralmente conservada a capela-mor, cuja arquitectura está perfeitamente de acordo com as sucessivas obras de decoração ali realizadas desde a reforma contemporânea de D. João II à iniciada em 1839. E assim se conservarão as memórias das remodelações por que passou a igreja através dos tempos- e se conservarão na sua parede artisticamente mais valiosa".
Acham que "será lícito deixarmos também nós ali o testemunho da nossa época".
Não encontram nos altares laterais "valor artístico suficiente" para serem conservados, e são de opinião que eles "não representam algo que esteja arreigado na devoção dos vimaranenses".
O órgão que está no coro, "ocupando quase todo um tramo da nave central", dizem que "altera completamente a verdadeira proporção da igreja, roubando-lhe grandeza". Propõem assim que o órgão seja deslocado "para um local onde possa continuar a prestar nesta igreja, se for possível, mas em todo o caso sempre em Guimarães, os seus serviços à comunidade dos fiéis".
Quanto ao janelão, aceitam a necessidade de o "desentaipar", "removendo de vez o horrendo biombo de granito com que foi preenchido, ao que parece nos fins do séc XVII, e substituindo-o por algo que o restitua à sua verdadeira finalidade: a iluminação da nave", e o órgão tinha, para isso, de sair do seu espaço. Propõem que se reflicta acerca de como deverá ser esse vitral.
Propõem o desaparecimento dos altares laterais, abrir frestas nas paredes exteriores para iluminação da igreja, e que se estude "o problema da escada exterior da torre e dos arcos entaipados" .
Como se vê, os vimaranenses signatários do documento consideram-se, e muito bem, "dentro da doutrina actual que preconiza a conservação dos enriquecimentos e transformações que cada época trouxe a um determinado monumento". Mas não deixam de reconhecer, para salvar (!), ao que dizem, as estruturas do templo, a necessidade "de destruir grande parte da obra oitocentista ali realizada", de apoiar a demolição dos altares laterais (que dizem não terem "valor artístico suficiente", nem representarem "algo que esteja arreigado na devoção dos vimaranenses"-  o que é falso) e de propor que o órgão seja deslocado ou retirado do seu local.
A proposta que fazem de o espaço do janelão (onde sabemos ter havido, pelo menos até ao tempo do Padre Torquato de Azevedo, "uma vidraça grande que por sua cristalina fineza lhe dá luz para rezarem nele as horas canónicas nos dias em que as não rezam no coro de baixo") ser desentaipado ainda que compreensível, não seria viável, já que mexeria com a posição do órgão. Mas a emenda feita pelos Monumentos Nacionais no 'janelão' desviou ainda mais o monumento da sua originalidade.
Quanto à Capela de São Nicolau, nem uma palavra. Indirectamente, ao não reconhecerem nenhum dos altares laterais "arreigado na devoção dos vimaranenses" (e entre esse altares figurava um a São Nicolau), estavam a repudiar todo um passado que o culto de São Nicolau marcou na igreja da Colegiada.

Autor:
Lino Moreira da Silva
São Nicolau - A sua Irmandade e a sua Capela na Insigne e Real Colegiada de Guimarães
Edição da Associação dos Antigos Estudantes do Liceu de Guimarães

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